sábado, fevereiro 20, 2010

O plagiador


Para a Caroline, o Bruno e o Roger.

Ele nunca soube nosso nome. Nós, ao contrário, nunca mais esquecemos o dele. Marcos Beccari. Capricorniano, 22 anos. Escritor profissional, exibicionista amador. Desenhista de mão cheia (ou poeta de alma vazia?). Em resumo, um artista incompreendido em busca de manifestações descartáveis e temporárias para uso próprio. Um lixo que ele pudesse chamar de seu.

Ele ria de nós e dos nossos codinomes. Nos tomava por artistas românticos, vaidosos, pretensiosos. Que escrevíamos para a posteridade, ainda que não passássemos de pobres anônimos, demônios solitários ocultos no avesso de uma tela luminosa. Ele devia supor que apertávamos a mão de um amigo como quem pressiona o botão do mouse.

O Marcos, aquela criança bobona que continua se engalfinhando com palavras bonitas como verdade, linguagem, autoria, artifício, ready-made. Aquele guri confuso em busca de alguma autenticidade. Ele não sabe o nosso nome, nunca soube o nosso nome. E como saber, se somos invisíveis? Para quê saber, se não deixaremos rastro daqui a 100 anos, quando todas as urls do mundo expirarem.

Então, vocês podem imaginar o susto que levei quando, na sala da casa de um amigo em comum, fomos apresentados: “Mariana, este é o Marcos Beccari, baita autor, está terminando um livro. Escreve prá caralho. Marcos, essa é a Mariana Sanchez. Vocês já se conhecem?”. Quis dizer que ele tentou fazer um filho em mim, sem o meu consentimento – nem o da minha linguagem –, e que jamais deixei de ser eu para me tornar outro, menos ainda seu heterônimo. Ao invés disso, aceitei o jogo: conversamos respeitosamente e até trocamos cartões de visitas, cunhados com nossos nomes verdadeiros.

Antes de ir embora, ainda manifestei meu interesse em ler sua obra mais recente. Só assim, pela caligrafia do autógrafo na folha de rosto, eu conheceria finalmente a sua assinatura.